A Lei n.º 38/2018, de 7 de agosto, veio estabelecer o direito à autodeterminação da identidade
de género e expressão de género e à proteção das características sexuais de cada pessoa.
Consagra o n.º 2 do seu artigo 3.º que «quando, para a prática de um determinado ato ou procedimento,
se torne necessário indicar dados de um documento de identificação que não corresponda
à identidade de género de uma pessoa, esta ou os seus representantes legais podem solicitar que
essa indicação passe a ser realizada mediante a inscrição das iniciais do nome próprio que consta
no documento de identificação, precedido do nome próprio adotado face à identidade de género
manifestada, seguido do apelido completo e do número do documento de identificação».
No âmbito das medidas de proteção, estipula o n.º 1 do artigo 12.º da referida lei, sobre educação
e ensino, que o Estado deve garantir a adoção de medidas no sistema ucativa.
Compete aos membros do Governo responsáveis pelas áreas da igualdade de género e da
educação adotar as medidas administrativas necessárias para a implementação do previsto no
n.º 1 do mesmo artigo.
Nesse sentido, e sem prejuízo da obrigatoriedade de as escolas adotarem, no âmbito das suas
competências, as condições necessárias para o exercício efetivo do direito à autodeterminação da
identidade de género e expressão de género e do direito à proteção das características sexuais das
crianças e jovens, importa, através do presente despacho, estabelecer tais medidas administrativas
que possam contribuir para garantir o livre desenvolvimento da personalidade das crianças e jovens
e para a sua não discriminação em ambiente escolar, garantindo a necessária articulação com os
pais, encarregados de educação ou representantes legais dos mesmos.
Assim, ao abrigo e nos termos do n.º 3 do artigo 12.º da Lei n.º 38/2018 de 7 de agosto, e no
âmbito dos poderes delegados pela Ministra da Presidência e da Modernização Administrativa,
através do Despacho n.º 4778/2019, publicado no Diário da República, 2.ª série, n.º 91, de 13 de
maio de 2019, e pelo Ministro da Educação, através do Despacho n.º 1009 -B/2016, publicado no
Diário da República, 2.ª série, n.º 13, de 20 de janeiro de 2016, determina -se o seguinte:
Artigo 1.º
Objeto
O presente despacho estabelece as medidas administrativas que as escolas devem adotar
para efeitos da implementação do previsto no n.º 1 do artigo 12.º da Lei n.º 38/2018, de 7 de agosto,
Artigo 2.º
Medidas administrativas
Considerando a necessidade de garantir o exercício do direito das crianças e jovens à autodeterminação
da identidade e expressão de género e do direito à proteção das suas características
sexuais, e no respeito pela singularidade de cada criança e jovem, devem ser adotadas em cada
escola medidas que, promovendo a cidadania e a igualdade, incidam sobre:
a) Prevenção e promoção da não discriminação;
b) Mecanismos de deteção e de intervenção sobre situações de risco;
c) Condições para uma proteção adequada da identidade de género, expressão de género e
das características sexuais das crianças e dos jovens;
d) Formação dirigida a docentes e demais profissionais.
Artigo 3.º
Prevenção e promoção da não discriminação
Para efeitos de prevenção e combate contra a discriminação em função da identidade e expressão
de género em meio escolar, as escolas desenvolvem, entre outras, as seguintes medidas:
a) Promover ações de informação/sensibilização dirigidas às crianças e jovens, alargadas
a outros membros da comunidade escolar, incluindo pais ou encarregados de educação, tendo
em vista garantir que a escola seja um espaço de liberdade e respeito, livre de qualquer pressão,
agressão ou discriminação;
b) Estabelecer mecanismos de disponibilização de informação, incluindo o conhecimento de
situações de discriminação, de forma a contribuir para a promoção do respeito pela autonomia,
privacidade e autodeterminação de crianças e jovens que realizem transições sociais de género.
Artigo 4.º
Mecanismos de deteção e intervenção
1 — As escolas devem definir canais de comunicação e deteção, identificando o responsável
ou responsáveis na escola a quem pode ser comunicada a situação de crianças e jovens que manifestem
uma identidade ou expressão de género que não corresponde à identidade de género à
nascença.
2 — A escola, após ter conhecimento da situação prevista no número anterior ou quando a
observe em ambiente escolar, deve, em articulação com os pais, encarregados de educação ou
com os representantes legais, promover a avaliação da situação, com o objetivo de reunir toda a
informação e identificar necessidades organizativas e formas possíveis de atuação, a fim de garantir
o bem -estar e o desenvolvimento saudável da criança ou jovem.
Artigo 5.º
Condições de proteção da identidade de género e de expressão
1 — Tendo em vista assegurar o respeito pela autonomia, privacidade e autodeterminação das
crianças e jovens, que realizem transições sociais de identidade e expressão de género, devem
ser conformados os procedimentos administrativos, procurando:
a) Estabelecer a aplicação dos procedimentos para mudança nos documentos administrativos
de nome e/ou género autoatribuído, em conformidade com o princípio do respeito pelo livre desenvolvimento da personalidade da criança ou jovem em processo de transição social de género,
conforme a sua identidade autoatribuída;
b) Adequar a documentação de exposição pública e toda a que se dirija a crianças e jovens,
designadamente, registo biográfico, fichas de registo da avaliação, fazendo figurar nessa documentação
o nome adotado, de acordo com o previsto no n.º 2 do artigo 3.º da Lei n.º 38/2018, de
7 de agosto, garantindo que o mesmo não apareça de forma diferente da dos restantes alunos e
alunas, sem prejuízo de nas bases de dados se poderem manter, sob confidencialidade, os dados
de identidade registados;
c) Garantir que a aplicação dos procedimentos definidos nas alíneas anteriores respeita a
vontade expressa dos pais, encarregados de educação ou representantes legais da criança ou
jovem.
2 — No âmbito das medidas conducentes à adoção de práticas não discriminatórias, devem
as escolas emitir orientações no sentido de:
a) Fazer respeitar o direito da criança ou jovem a utilizar o nome autoatribuído em todas as
atividades escolares e extraescolares que se realizem na comunidade escolar, sem prejuízo de
assegurar, em todo o caso, a adequada identificação da pessoa através do seu documento de
identificação em situação que o exijam, tais como o ato de matrícula, exames ou outras situações
similares;
b) Promover a construção de ambientes que na realização de atividades diferenciadas por
sexo permitam que se tome em consideração o género autoatribuído, garantindo que as crianças
e jovens possam optar por aquelas com que sentem maior identificação;
c) Ser respeitada a utilização de vestuário no sentido de as crianças e dos jovens poderem
escolher de acordo com a opção com que se identificam, entre outros, nos casos em que existe a
obrigação de vestir um uniforme ou qualquer outra indumentária diferenciada por sexo.
3 — As escolas devem garantir que a criança ou jovem, no exercício dos seus direitos, aceda
às casas de banho e balneários, tendo sempre
Artigo 6.º
Formação
As escolas devem promover a organização de ações de formação dirigidas ao pessoal docente
e não docente, em articulação com os Centros de Formação de Associação de Escolas (CFAE),
de forma a impulsionar práticas conducentes a alcançar o efetivo respeito pela diversidade de
expressão e de identidade de género, que permitam ultrapassar a imposição de estereótipos e
comportamentos discriminatórios.
Artigo 7.º
Confidencialidade
As escolas devem garantir a confidencialidade dos dados dos jovens que realizem o processo
de transição de género.
Artigo 8.º
Entrada em vigor
O presente despacho entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.